sábado, 14 de novembro de 2009

Olhares teóricos: considerações psicanalíticas de um ex-behaviorista.

Como todos sabem, o Behaviorismo Radical é alvo de uma imensa quantidade de críticas - quase todas, no entanto, não condizem com o que a proposta Skinneriana diz de fato.


Há alguns dias um professor meu me passou um texto escrito por um ex-behaviorista radical (hoje é um psicanalista lacaniano), com doutorado em Psicologia Experimental chamado Jefferson M. Pinto (lattes), no qual são discutidas diferenças existentes entre o método Analítico-Comportamental e Psicanalítico, em tese. Na prática, o texto é apenas mais um no qual são feitas críticas incondizentes com o Behaviorismo Radical. O nome do texto é Por que os ratos não falam?, e está publicado no livro Cadernos de Psicologia da UFMG, vol VII.

Escaneei o texto e coloco disponível neste link para quem quiser acessar na íntegra. Destaco, no entanto, alguns dos comentários incondizentes contidos no mesmo com relação ao Behaviorismo Radical. 

"... o procedimento científico está dirigido no sentido de calar-lhes a boca [do sujeito-rato]... é aí que começa a eterna polêmica entre Behaviorismo e Psicanálise. O primeiro impede a fala... a segunda quer que a verdade fale..."

"... ele [Skinner] foi um crítico feroz das amarras teóricas que um sistema hipotético dedutivo impõe ao pesquisador e valorizou o dado causal e a atitude de 'mente aberta do cientista'. A preponderância de um sistema assim implica problemas metodológicos, tais como o das definições operacionais, e não leva em conta a realidade quotidiana do cientista..." 


"E aí aparece a fonte de muitos problemas. A redução [ao empírismo científico] imposta cria uma impossibilidade inerente à própria constituição da ciência: a de estarmos afastados do real." 

 "... o Behaviorismo está imerso no empirismo, baseado na suposição de que a realidade não é construída, mas dada aos aparelhos de sentido, como se o comportamento - objeto de uma ciência - fosse empírico, da ordem do anedótico..."

"... como argumenta Lacan, 'não existe comportamento humano. Pode haver uma atuação (acting out) como resistência a uma elaboração regida pelo processo segundário. O argumento de Lacan consiste no fato de que falar em comportamento humano implica negar o papel do simbólico na constituição do sujeito..."

"... apesar de toda a crítica a um mentalismo que estagnava a psicologia, 'o behaviorismo não produziu nenhuma reviravolta da ética' (Lacan, 1985) nem poderia, já que seus pressupostos são de uma ciência natural..."

"... com este procedimento [científico-behaviorista] passamos a ter certeza do saber produzido, principalmente depois que outros replicaram o experimento e confirmaram ou não nossa certeza. Ou seja, não estamos 'psicóticos' sozinhos. Há um saber que fala por nós e passa a ser um grande Outro capaz de decidir sobre os nossos próximos passos. A certeza buscada é tão absoluta, que dependendo da constituição psíquica... do cientista, ele sofrerá crises imensas, de acordo com o grau de crise que sua ciência estiver atravessando. O sujeito é eliminado e o saber passa a ser certo..."


"O saber fica objetivado, pois a mística, a magia e as interpretações ficam eliminadas. E o sujeito só aparecerá na cadeira de significantes do discurso da ciência enquanto falta. Essa é, portanto, a perda maior de qualquer empreendimento científico"

"... quanto mais 'científica' for minha pesquisa, mais psicotizante será o saber produzido. Essa é uma verdade da qual a ciência nada quer saber. Daí o ideal positivista de criar uma língua formal sem os equívocos que a língua natural possibilita. Desnaturalizar a língua para ganhar em saber e perder na produção da verdade do sujeito... pois é justamente nestes equívocos [evitados pelo Behaviorismo] que vemos a emergência do sujeito"

"... a ciência pode, mesmo, pretender eliminar a psicanálise, mas tudo o que ela elimina acaba retornando como um recalcado."


Como já comentado, obviamente todos estes comentários a respeito da Análise do Comportamento são FALSOS. Eu fico me perguntando como é que um DOUTOR em Psicologia Experimental pela USP comete este tipo de equívoco teórico e epistemológico. A USP, como todos sabem, é um dos melhores centros de formação do país, e quem sabe da América Latina.

Após anos de estrada na Análise do Comportamento, o autor tornou-se um Psicanalista Lacaniano. É uma virada e tanto no modo de pensar.

Penso que tais equívocos cometidos no texto devem-se principalmente (para não falar de má-fé) a divergências teóricas, embora algumas não pareçam de modo algum ser. O que acham? O cara é doutor em Psicologia Experimental, não acredito que seja por desconhecimento.






6 comentários:

Alan disse...

... como argumenta Lacan, 'não existe comportamento humano. Pode haver uma atuação (acting out) como resistência a uma elaboração regida pelo processo segundário. O argumento de Lacan consiste no fato de que falar em comportamento humano implica negar o papel do simbólico na constituição do sujeito..."

doutorado em Psicologia Experimental na USP? Será que ele chegou a ler o Verbal Behavior? ;/

Neto disse...

Oi Alan,

a impressão que tenho quando leio este tipo de comentário de que, pelo menos em tese, deveria conhecer a Análise do Comportamento, é de que o que o que move essa crítica é má-fé.

marcelo disse...

Depois quando eu digo que qualquer jumento pode ser um doutor hj em dia, ninguem acredita...

Como um cara doutor pela USP em Experimental pode dizer :" Skinner desenvolveu um ambiente experimental para avaliar o sistema digestivo de ratos e criou o comportamento operante"

Nossa senhora

Salvatti disse...

Do artigo: “Reconstituamos o paradoxo: Se o discurso da ciência elimina o sujeito, como fazer uma ciência do inconsciente do sujeito?”

Angustiado, o autor chafurdou-se em fundamentalismo barato, concluindo sobre o método ideal, a sua psicanálise, claro.

Neto disse...

Márcio,

fundamentalismo este que, mais uma vez, exclui aspectos básicos da AC.

Neto disse...

Marcelo,

é complicado isso... Eu estava conversando com a Maria Ester Rodrigues e concordamos que estas críticas estão mais para discordâncias teóricas do que desconhecimento. É claro, creio que exista aí muita ma fé também.